Comentários infelizes

Assistindo a um dos programas esportivos ditos jornalísticos, tive a oportunidade de ver uma conversa descontraída entre apresentadores, narradores e repórteres. A conversa acontecia à beira do campo onde o Brasil treinava antes do jogo contra o Egito. Um dos assuntos principais da conversa era a beleza das coreografias dos sul-africanos e a felicidade com que os mesmos recebiam a Copa das Confederações e em especial nossa seleção.
No meio da conversa um famoso narrador e jornalista, recém chegado ao país da Copa de 2014, passou a fazer comentários no mínimo infelizes, pra não dizer preconceituosos.
Seus comentários diziam que o lugar onde se localizava o campo que a seleção brasileira treinava encontrava-se no meio de um gueto, e que isso tratava-se de um absurdo. Continuou a falar que não acreditava que a FIFA tivesse liberado um lugar tão mal localizado para abrigar os treinos de uma seleção tão importante. Disse que não havia segurança naquele local e que era um lugar muito afastado. Não satisfeito, ainda teceu comentários sobre toda a estrutura montada para a Copa das Confederações e para a Copa do Mundo, dizendo que tudo era muito precário.
Comparou com a Copa realizada na Alemanha em 2006, e menosprezou a África, dizendo que nem se comparava ao que ele tinha visto anos atrás. E por fim criticou os meios de transporte do país e os estádios que serão utilizados.
Claro que ninguém me paga pra ficar assistindo esses programas esportivos, mas é o que tem, e quem gosta de esportes e futebol e não pode pagar por canais fechados não tem muita escolha. Exatamente por ser um canal aberto, e que tem milhões de expectadores, o narrador/jornalista deveria aproveitar a oportunidade pra dizer como é importante, pra um país e para um continente, tão pobre e esquecido, realizar um evento de tal magnitude e visibilidade.
Ele poderia também aproveitar pra dizer que mesmo com algumas limitações (que são óbvias) a África do Sul e todo o continente africano estão fazendo o seu melhor para tentar receber todos bem e cumprir com seu papel de anfitriões.
Mas pra mim o mais inaceitável de tudo é dizer que por se encontrar em meio a um gueto, o local de treinos da seleção brasileira era inapropriado.
Eu acredito que a Copa do Mundo é feita para as pessoas, em especial as pessoas do país sede. Pois são elas que acompanham anos de preparação, elas que sentem as transformações e a emoção de participar desse evento.
Também não quero ser ingênua, sei que o objetivo de uma Copa do Mundo é gerar renda, aumentar o turismo, fazer o país ser mais conhecido mundialmente. Mas, nesse caso específico, onde a esmagadora maioria da população é pobre ou miserável, se o local de treinos fosse no centro, ou longe das periferias, a maioria dessas pessoas que estavam prestigiando o Brasil não teriam oportunidade de fazê-lo.
Num país onde muitos morrem por não ter sequer o que comer, como é que essas pobres pessoas teriam acesso a um evento tão importante se ele não fosse feito pra que elas pudessem participar de alguma forma. Que alegrias essas pessoas tem na vida? Quantas vezes elas verão uma seleção de outro país em seu gueto? Quantos motivos elas tem pra cantar, dançar, se divertir?
Ou será que esse senhor, tão respeitado jornalista, acha que a Copa do Mundo é feita pra imprensa, pros jornalistas, pros ricos, pras pessoas importantes, apenas para americanos do norte e europeus?
É o que parece.
Só lamento que um espaço tão importante e caro, e principalmente influente seja usado de forma tão suja e preconceituosa.